'Haru'

Leio a frase de um amigo: “Sentindo-me como um Japonês...”

Vejo a foto da mulher sentada no chão, chorando, ‘sobrevivente meio ao caos’ -de acordo com a manchete.

Não consigo evitar de ver as outras fotos, as outras tragédias pessoais: a mulher que grita chamando pelo parente desaparecido, a menina com alto nível de radiação que não pode tocar o cão, o perigo iminente da explosão da usina, as prateleiras vazias.
Penso nas catástrofes individuais, ‘tsunamis’ arrasadores em nossas frágeis vidas, terremotos destruidores que nos deixam desequilibrados, bombas atômicas que nos avassalam. Contudo, a devastação massiva, o descontrole generalizado, a desordem disseminada ocorrendo em nosso planeta, com pessoas que compartilham conosco suas perdas, dores, seu desespero, nos tocam profunda e inexoravelmente, nos conduzindo à reflexão e a um sentimento de solidariedade veemente, e, por um momento, sinto-me envergonhada de minhas pequenas preocupações. E meu mundo se torna imenso; além da cerca da minha casa e da minha pequena família, além da minha profissão, da minha conta bancária, da minha rede de amigos ou das minhas poucas e esparsas posses, que nada mais são que ‘empréstimos’ que recebi temporariamente. E as coisas materiais tornam-se nada, não me tornam acima, abaixo, ‘in’ ou ‘out’. O que permanece, persiste e revive, é essa minha essência repleta e incompleta, que luta, busca, que perde, mas que sempre ganha, sem saber; mesmo que isso seja somente visto por mim.

O Japão, indubitavelmente, não será mais o mesmo; transpõe mais uma guerra que mobiliza os pensamentos de outros - como nós. O Japão agora não é mais apenas uma ilha hiper/super/mega desenvolvida, de tecnologia avançada, com luzes brilhantes, flores nas cerejeiras, porcelana delicada, kimonos de seda, algas, caracteres ilegíveis aos ocidentais, disciplina silenciosa, gestos delicados, riqueza cultural e material. O Japão agora se localiza em nós, continentes sujeitos às intempéries, placas tectônicas que se ajustam, afastam, deslocam, chocam.  E, apenas com a passagem dos anos, dos séculos, conseguiremos perceber, com um olhar cansado, o fluxo em que fomos levados.






Nenhum comentário:

Postar um comentário

Não deu tempo