Fazia alguns dias que não se
falavam. Não precisava. Quando estavam juntos bastava. Parecia um século em
poucas horas.
Era julho. Frio, chuva, vento,
Bem como ela gostava. Ele detestava.
Pliiim... Email chegando.
‘Tudo bem com você? Tô com
saudade. Como está sua semana? Tenho umas brechas no meu horário, gostaria de
ver você.’
Ela adorava ser o ‘você’ de
alguém. Todos só a chamavam de ‘tu’.
Olhou a agenda lotada de 2ª a sábado.
Era apenas 2ª e já não tinha mais tempo. Nunca. Não tinha tempo pra si. Seu
nome era trabalho, compromisso, ética.
Que chata... Pensou, pensou... Respondeu o email.
‘Pode ser amanhã, 3ª? Trabalho
até o meio dia e vou pra casa. Mas no fim do dia tenho que voltar lá pelas 18
horas. Fica bom pra ti?’
Riscou a agenda, cancelou
compromissos, deu desculpas, sentiu a emoçãozinha aquela de quem estava fazendo
alguma coisa errada e na 3ª estava lá, pronta. Acendeu a lareira e esperou por
ele. Sentaram ao redor do fogo, conversaram lado a lado, e ele enfileirou mais
lenha para secar na borda da lareira junto à grade de ferro.
O que aconteceu depois? De
verdade? Não sei, não lembro. Imagino, mas não sei, e não me importo.
Anos depois, em um julho frio,
chuvoso e ventoso, acende a lareira e coloca a lenha pra secar na borda. Olha
pro fogo, quase queima as mãos, se aquece, lembra dos olhos azuis brilhantes, sente
o aroma de rosas nos lençóis e sente uma paz imensa. Que bom que tinha deletado
um compromisso naquele dia distante, e outro, e mais outro...
Desta vez não teria que voltar
pro escritório e continuar trabalhando por mais algumas horas que nem iria ver
passar. Desta vez não iria receber mensagem, email, nem o telefone iria tocar.
Bem, do jeito que ele era
apavorado com doenças, se estivesse aqui não iria sair de casa. NUNCA, e talvez
nunca mais. Definitivamente ele iria odiar o COVID.