'Sonhar é acordar-se para dentro.' - M. Quintana
'Heart'
Google Images
‘No fim tu hás de ver
que as coisas mais leves são as únicas
que o vento não conseguiu levar:
um estribilho antigo
um carinho no momento preciso
o folhear de um livro de poemas
o cheiro que tinha um dia o próprio vento...’ – M. Quintana
que o vento não conseguiu levar:
um estribilho antigo
um carinho no momento preciso
o folhear de um livro de poemas
o cheiro que tinha um dia o próprio vento...’ – M. Quintana
Ela olhou aquela imagem e... buuump!
Não conseguiu furtar-se de cair
naquele dia (ou noite) em que cozinhavam juntos. Não lembrava se era almoço ou
jantar, mas definitivamente não conversavam sobre amenidades. Eram coisas importantes,
sobre seu papel de pai, ex, filho, profissional, homem. Era literalmente ‘abrir
o coração’, eram suas dúvidas, medos, momentos felizes e pequenos acidentes
domésticos. Ela não sabe até hoje se foi
ali, naquele exato momento, em que ele despiu sua alma frente a ela, que tudo
teve início. Talvez sim, talvez não. Ela ouvia atentamente aquele homem contar
suas fraquezas e puramente falar de si, como se eles se conhecessem desde
sempre. E enquanto ele falava ela o ouvia dentro de sua alma.
Aproximou-se dele e encostou a cabeça em seu peito, que era exatamente na
altura da cabeça dela. Aquele peito tão peludo e quentinho – conhecera poucos
homens assim – ‘Você sabia que uma vez uma criança viu meu peito na piscina e
saiu correndo apavorada? Nunca tinha visto alguém com tanto pelo.’ – Ela riu
muito com a história, imaginando a cena. E ele falou sério.
Assim, aninhada, ouviu seu coração. Levantou a mão e tocou no peito
dele. Sentiu a mão quente. Sentiu o coração dele em suas mãos e lhe disse: ‘Tu
não vais acreditar, peguei teu coração na minha mão.’- Ficaram em silêncio.
Talvez ainda fosse muito cedo pra manifestar algo tão insólito, que nunca havia
lhe acontecido antes e nunca voltaria a ocorrer depois.
Quando viu a ilustração, anos depois, constatou aquela emoção materializada em formas, cores
e sentimento. Ela não era a única. Ela
não era louca. Ela não era esquisita. Ela só havia sido tocada pelo amor. E quanto amor...
'Da Felicidade'
Quantas vezes a
gente, em busca da ventura,
Procede tal e qual o avozinho infeliz:
Em vão, por toda parte, os óculos procura
Tendo-os na ponta do nariz! - M. Quintana
Procede tal e qual o avozinho infeliz:
Em vão, por toda parte, os óculos procura
Tendo-os na ponta do nariz! - M. Quintana
Encontrou-o em uma loja, tentando se comunicar com a
vendedora e com uma peça de roupa feminina caríssima em suas mãos, mais meia
dúzia de peças masculinas dobradas cuidadosamente. Entendeu que ele queria trocar a blusa da namorada.
Não falava português, definitivamente.
Observou a situação por alguns minutos e não querendo
interferir na comunicação truncada de ambos, finalmente ofereceu ajuda. Ele sorriu com seus
olhos azuis, aliviado por escutar sua língua e aceitou o auxílio com muitos ‘thank
you’ e alguns ‘please’.
Entendeu que a namorada estava fora; havia passado as festas
longe dele que estava trabalhando naquele país quente e tão diverso ao seu. Entendeu
também que ele estava comprando roupas pois não sabia como chegar à lavanderia e
pedir para deixar as roupas lá. Entendeu que o que haviam combinado havia sido
mudado repentinamente. Entendeu que ele estava tentando adaptar-se a alguém tão
singular, com hábitos tão dissemelhantes. Em 15 minutos entendeu tudo. E
caiu... Caiu em si. Num túnel do tempo
de 2.190 dias.
Enquanto ele discorria num discurso ao fundo, distante,
quase que inaudível, lembrou de tudo que havia feito. TUDO errado. Não era o
tipo de pessoa de validar seus sentimentos com palavras e elogios superficiais,
recheadas de ‘cama’, beijos demorados, abraços de três ‘’mississipis’. Era na
sua. Sua forma de retratar seus sentimentos era rigorosamente adversa ao que
ele lhe contava. Não iria deixar alguém que veio de longe sem roupas lavadas,
cheirosas e passadas, não iria deixá-lo passar o Ano Novo sozinho, não iria...
nem iria... Iria limpar a casa para recebê-lo,
iria preparar a comida que ele podia e gostava de comer. Iria fazer as compras
no mercado, pagar por seu bolo de aniversário, limpar a casa dele, sair no
domingo (que ela detestava). Estaria lá, disposta, velando por algo que JAMAIS
iria acontecer.
Imersa nos seus pensamentos escutou-o repetir 'com licença' com
aquele sotaque inconfundível e desculpou-se pela enxurrada de informações. Encontrava-se
visivelmente exaurido de apostar, arriscar, confiar. Ela já havia visto esse
filme. Ela já sabia como ele iria terminar. Só que ele ainda teria que viver
aquilo um pouco mais, talvez até mais alguns anos, até chegar o dia em que
teria que seguir por si, talvez trocado por um par de calças novas. Ela não
podia intrometer-se. Só sabia que
necessitava de um tempo pra digerir aquelas informações tão valiosas que ele
lhe permitia. Definitivamente, aquele encontro não fora fortuito.
Por fim, ele lhe perguntou como poderia retribuir pela
ajuda, afinal, não havia nem lhe perguntado seu nome. Ela que havia lhe assistido naquela sinuca de bico, que havia lhe
ouvido e mostrado o caminho da lavanderia. Não lhe disse que ELE a havia
ajudado a cair na real. Não lhe disse que era tão grata quanto ele pela efemeridade
do encontro. Em vez disso apenas lhe entregou seu cartão de visitas com um ar profissional e experiente e foi viver
sua vida nova.
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